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Entrevista | Pai Sidney • Terreiro Ilê Wopô Olojukan

Como você começou sua trajetória de liderança no Terreiro Ilê Wopô Olojukan? É uma herança familiar?

Em 1995 eu vim em uma festa aqui no terreiro, na Festa de Oxossi do meu avô de santo. Eu não tinha muito contato com ele, a não ser no aniversário dele no, dia 19 de abril, e na festa de Oxossi. Nos eramos bem distantes um do outro. Nessa festa, após Oxossi chegar, ele chamou o Orixá do meu pai de santo, que é Oxum, e mandou vestir. Quando ela estava pronta, ele trouxe ela para dançar, me pegou e me colocou atrás de Oxum. Nessa hora, Oxossi fez uma pergunta à Oxum que ela balançou a cabeça e mandou comunicar a todos que ali estava o herdeiro da casa: eu. Foi um impacto muito grande, 80% do terreiro e dos filhos de santo não aceitaram, a festa acabou por ai e até meu pai de santo não aceitou que eu fosse o herdeiro. Eu já sabia que eu seria um Babalorixá, mas jamais pensei que seria aqui no Ilê Wopô Olojukan porque em 1986, quando eu fiz Santo, eu recebi através um recado de Oxossi dizendo que eu tinha cargo e que deveria durante 7 anos, até terminar minha iniciação providenciar um terreiro.

Me corrija se estiver errado por favor, o nome Ilê Wopo Olojukan significa “Casa onde o trono é de Odè Olojukan (aquele que vê com os olhos do coração)”, certo? Como você guia o seu trabalho de liderança a partir deste “ver com os olhos do coração”?

O nome Olojukan significa aquilo que vê com os olhos do coração. O Socarlos, pelo o conhecimento que eu tenho, sempre agiu assim, ajudando qualquer pessoa independentemente de qualquer situação financeira ou etnia. Eu sigo esse caminho, honrando esse nome “aquele que vê com os olhos do coração”, tentando fazer meu trabalho de uma forma justa, honesta e olhando a todos sem discriminação. É importante perceber que o ser humano precisa de ajuda e que não podemos julgar nem condenar ninguém. É uma expressão que tem uma conotação para um olhar muito puro e sublime.

Em tempos tão difíceis como o que vivemos no Brasil atualmente, quais as principais dificuldades que você tem encontrado para seguir esta ideia?

Hoje, a grande dificuldade que eu vejo através do que a gente vive é a questão da descriminalização e preconceito pelos neo pentecostais. Eu sou formado em Filosofia, estudei com vários seminaristas dentro dó instituo São Tomas de Aquino para estudar uma filosofia voltada para a religiosidade. Sinto que a ignorância do povo, do radicalismo é o grande problema não só da minha religião mas de tantas outras que são perseguidas.”

Como está atualmente a questão do tombamento do terreiro?

Quando em 1995 o terreiro foi tombado, através das comemorações dos 300 anos da imortalidade de Zumbi, tivemos um reconhecimento de que a comunidade de matriz africana faz parte dessa cidade e desse país. Foi uma forma de demarcar o espaço e a importância dos nossos irmãos escravizados, que fizeram esse Brasil em que vivemos hoje. Portanto, é uma forma de mostrar para o povo que somos importantes e que a nossa cultura tem um enorme valor para o Brasil. Quanto a questão do tombamento, a prefeitura tombou e tornou o espaço em um lugar em que não posso fazer tanta coisa, apesar de o tombamento ser para o imaterial. Depois da administração petista, caiu em esquecimento. Aqui na regional norte, mal sabem que existimos. Eu tive procurei o Juca Ferreira, o Secretário Municipal de Cultural, para me apresentar e ele ficou surpreso de saber que aqui tinha um terreiro tombado pelo patrimônio cultural. Quer dizer, as outras administrações do governo do PT nem tem o conhecimento deste marco tombado por eles mesmo. Mas como eu não fico atrás do poder público para pedir as coisas, só mesmo o tombamento que ficou já que não tem ações no terreiro, eles não vem aqui, não existe tanto um diálogo de inserção.

Você pode contar um pouco sobre tradição Yorubá (Ketu)?

O pessoal de Ketu já chegou já no final da escravidão, então com o ainda estava muito recente suas práticas na áfrica, em ketu, em Asobô, Elegibô, eles conseguiram manter sua tradição. E através do ketu é que o pessoal Bantu teve a oportunidade de agregar junto com o pessoal de Ketu para continuar com a sua crença.Isso fez com que o Ketu tornasse um segmento da cultura afro, onde recriou um candomblé africano aqui no brasil devido às condições que o Brasil oferecia. Não podemos dizer que fazemos um candomblé africano, culto aos orixás igual era na África.E o mais interessante é que Brasil e Cuba manteve essa tradição, que hoje é extinta praticamente, uma cultura religiosa morta na África.

Qual a principal ou as principais dificuldades que enfrentam na inclusão na sociedade como um todo?

Por hoje a gente viver este crescimento das igrejas neo pentecostais e por muitos empresários serem evangélicos, cria-se um preconceito ao não empregar pessoas de terreiro, o que é uma total falta de respeito de cada um. Eu acredito que as pessoas deveriam respeitar as crenças e a liberdade de escolha de todos, que o Deus cristão inclusive prega isso, dando o direito para todo indivíduo seguir aquilo que acredita. Hoje, o que eu percebo, é que as pessoas estão muito voláteis, confundindo o ser humano com aquilo que ele professa. Eu tive um problema com um determinado segmento de prestação de serviço, em que eu precisei de fazer uma intervenção aqui no terreiro, mas quando a pessoa veio para fazer um orçamento ela não voltou mais e não me respondeu, por aqui ser um terreiro de candomblé e essa pessoa ser evangélica. Isso tudo não é uma questão de religião, mas sim de ignorância do ser humano.

O que vocês percebem que ainda poderia ser feito pelo poder público como forma de dialogar mais com as comunidades quilombolas e inseri-las propriamente na sociedade.

Eu acho que a prefeitura, o Estado, a federação, tem muito o que fazer pelos povos quilombolas e de terreiro, que por sua vez são comunidades excluídas por serem negros e que não tem nenhuma assistência do poder público. Uma coisa que poderia ser feita é a inserção e ajuda a essas comunidades para que fosse respeitados, criando ações que mostrassem a cultura praticada nestes espaços para quebrar as barreiras de preconceito e desenvolver o respeito.

O quão importante é a realização de eventos e atividades como a Mostra Cine Afro BH que se preocupam e comprometem com a valorização de comunidades quilombolas e com a atuação de líderes das comunidades de raízes de matriz africana no Brasil?

A Mostra Cine Afro BH é uma oportunidade para que as pessoas conheçam a cultura e criem um respeito, tanto para com o fazer cultural do candomblé e quilombola e também para as pessoas que realizam este fazer cultural. É uma forma de desmitificar nossa cultura e valorizar as pessoas que são discriminados e excluídos.

Em tempos tão difíceis como os que vivemos atualmente no mundo e no Brasil, você como líder de uma comunidade tem alguma mensagem que gostaria de passar para as pessoas?

Diante a todo o contexto nacional e mundial, eu deixarei uma mensagem pedindo para que as pessoas respeitem uns aos outros. Eu tenho uma concepção de que estamos vivendo uma guerra urbana, uma guerra nacional e uma guerra em todo mundo. É um confronto em que cada um está preocupando com si próprio e aquele que não é igual a mim tem de ser excluído. A mensagem que eu passo é que tenhamos mais empatia e amor ao próximo, independente de qualquer segmento religioso ou partidário. Um exemplo, hoje temos na política no Brasil uma bancada ruralista, uma bancada evangélica, a bancada do agronegócio, mas não temos uma representação nas assembleias estaduais, nas câmaras e nem no Congresso. Que nossos legisladores olhassem e entendessem que estão ali eleitos pelo povo, para legislar a favor de todos e sem discriminação. Eu não quero que me aceitem, eu quero respeitem a minha crença.

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